domingo, 21 de junho de 2015

Emília Viotti sobre o otimismo de alguns intelectuais europeus


        "Quando ouço Michelle Perrot, uma das historiadoras de vanguarda da França, dizer numa entrevista que a sociedade pós-moderna é uma sociedade em que as possibilidades de expressividade individual se multiplicaram, que o impacto dos sistema político e os modelos culturais têm sido exagerados e que afinal de contas as pessoas ainda têm sua vida privada, que suas faculdades críticas são cada vez mais desenvolvidas porque uma maior número de pessoas são educadas, eu me pergunto se de fato essa observação se aplica às camadas populares tanto nos países periféricos quanto no centro. Mas quando Perrot afirma que a sociedade pós-moderna é uma sociedade em que as pessoas têm um respeito muito maior pelas outras, eu me pergunto em que mundo ela tem vivido. Racismo, torturas, massacres de lideranças, guerrilhas, esquadrão da morte, problemas de sobrevivência que afetam o dia a dia de homens e mulheres das periferias, a violência do cotidiano, a manipulação da mídia, esse e tantos outros problemas que são o dia a dia de milhares de pessoas nas periferias do mundo não parecem ter entrado no universo de Michelle Perrot e de muitos intelectuais de vanguarda dos países desenvolvidos. Visto da periferia, o narcisismo celebratório e as formas de militância dessa nova vanguarda europeia que ignora o que se passa nos confins de suas ex-colônias parecem suspeitos, e isso me leva a indagar da validade de categorias interpretativas nascidas de uma experiência tão diversa e a perguntar até que ponto elas são úteis para entender a nossa realidade. Com isso não quero dizer que se deva simplesmente descartá-las, mas sim, que é necessário manter uma postura crítica em relação a elas." Emília Viotti da Costa, "A dialética invertida " (ensaio que dá título a coletânea), pp. 25-26

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