segunda-feira, 22 de abril de 2013

Vozes, Hermann Broch

             Os versos abaixo foram retirados do livro, Os Inocentes, e tiveram uma primeira versão em 1913/1914. A Primeira Grande Guerra estava a caminho, a Europa não seria mais a mesma. Hermann Broch mostra-nos o que viria a seguir,  a irresponsabilidade de muitos e o voluntarismo de poucos. Esses ao se tornarem protagonistas produziriam as mais diversas atrocidades. Vale a pena uma leitura do "poema": Vozes (primeira versão 1913/1914).

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Vozes (1913)

(...)
Eis a grande fase da juventude burguesa:
Ela pensa em amor, dinheiro e outras banalidades,
Inteiramente disposta a renunciar ao resto;
Construindo seus mundos à base de ciumeiras.
Deus é um requisito aproveitável em poemas,
E a política, outrora virtude principesca,
Mostra-se desprezível ao leitor de jornais,
Que a considera um simples vício da ralé.
Tal atitude livra-o de quaisquer deveres.
É isso o que acontecia em mil novecentos e treze,
Com um ruído surdo nas almas, 
Com gestos de palcos de óperas,
E, no entanto, ainda existia, leve e formoso,
O arco-íris, a aura dos ritos de eros,
Os ecos de festas passadas, 
Colarinhos engomados, espartilhos, rendas;
Ah, e as encantadoras crinolinas!
Ó derradeiro, meigo ano da despedida do Barroco!

(...)
Adeus Europa! A bela tradição chegou ao fim.

             Bum, bum bumba,
             Vamos à peleja;
             Não sabemos qual seja
             A luta mas a tumba,
             Em boa companhia,
             Será acolhedora.
             Se lá em casa chora
             A triste amada,
             Rimos de seu pranto.
             Com jubiloso canto,
            A baioneta em riste,
            Aleluia, aleluia,
            Nós vamos à peleja.


quinta-feira, 18 de abril de 2013

DAME LA MANO

DAME LA MANO


Dame la mano y danzaremos;
dame la mano y me amarás.
Como una sola flor seremos,
como una flor, y nada más...

El mismo verso cantaremos,
al mismo paso bailarás.
Como una espiga ondularemos,
como una espiga, y nada más.

Te llamas Rosa y yo Esperanza;
pero tu nombre olvidarás,
porque seremos una danza
en la colina, y nada más

Ternura, Gabriela Mistral
               "Acredito nos cafés, no diálogo, acredito na dignidade da pessoa, na liberdade. Sinto saudade, quase ansiedade de um infinito, mas humano, na nossa medida." A resistência,Ernesto Sabato.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

La hora

La hora

Hora, tiempo vacío
que por mis venas fluye;
hora que crece, inmensa,
no afuera sino adentro

Fluye, callado, el tiempo;
al borde de mí mesmo, 
sombra de mí, me miro:
?soy el mismo, soy otro?

En silencio me escucho:
escribo, borro, escribo
y al filo de esta pausa
me inventa una palabra.

Octavio Paz, 1941

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Estado Laico ameaçado, Feliciano não esta sozinho!!

EDITORIAL DO ESTADÃO, 31/03/2013


Pior que o caso do pastor

31 de março de 2013 | 2h 07
O Estado de S.Paulo
Com o noticiário do Congresso concentrado no escândalo Feliciano - a entrega da presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara ao deputado evangélico Marco Feliciano, do Partido Social Cristão (PSC), que deu motivos para ser considerado racista e homofóbico, e que insiste em permanecer no cargo, apesar dos incessantes protestos de que é alvo - a imprensa deu escasso destaque a uma aberração ainda maior. Na mesma quarta-feira em que o mau pastor mandou prender um manifestante, retirar os demais do plenário da comissão para, enfim, justificar a truculência com a alegação de que "democracia é isso", a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa aprovou uma proposta que agride um dos princípios basilares da República brasileira: o caráter laico do Estado.
De autoria do tucano João Campos, de Goiás, membro da suprapartidária bancada evangélica, o projeto estende às organizações religiosas a prerrogativa de contestar a constitucionalidade das leis no Supremo Tribunal Federal (STF). Pela Constituição, podem propor ações dessa natureza o presidente da República, as Mesas do Senado, Câmara e Assembleias Legislativas, governadores, o procurador-geral da República, a OAB, partidos com representação no Congresso, confederações sindicais e entidades de classe de âmbito nacional. O leque de agentes públicos e privados aptos a entrar no STF com as chamadas Ações Diretas de Constitucionalidade (Adin) é, portanto, suficientemente amplo para representar legitimamente as múltiplas correntes da população insatisfeitas com essa ou aquela norma legal - preservada a separação entre Estado e igreja.
Exemplo disso foi a liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias no bojo da Lei de Biossegurança aprovada pelo Congresso depois de intensos debates e plena participação da sociedade e sancionada pelo então presidente Lula em março de 2005. A Igreja Católica, por intermédio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que se bateu com veemência contra a medida, assim como fizeram outras denominações religiosas, contornou o impedimento constitucional de bater, ela própria, às portas do Supremo Tribunal. Não lhe foi difícil encontrar a alternativa na pessoa do procurador-geral da República, à época, o católico praticante Cláudio Fonteles. Admitida a Adin, a CNBB teve todas as oportunidades de sustentar os seus pontos de vista no curso do histórico julgamento - que concluiu pela constitucionalidade da lei.
Argumenta Campos, o autor do projeto acolhido pela CCJ, que as associações religiosas deveriam ter o direito de pedir à Justiça que invalide dispositivos legais que, no seu entender, poderiam interferir na liberdade religiosa e de culto, assegurada na Carta. Seria o caso de eventual legislação que torne crime a homofobia. Em alguns cultos evangélicos, como se sabe, o homossexualismo é verberado como uma das mais repulsivas ofensas às leis divinas. Nem sempre são nítidos os limites entre essa pregação e o incitamento do ódio aos gays. O pastor Feliciano, por exemplo, escreveu certa vez que "a podridão dos sentimentos dos homoafetivos levam (sic) ao ódio, ao crime, à rejeição". O problema, de toda forma, é a barreira infranqueável que impede o contágio do Estado pelas religiões organizadas e vice-versa.
Do mesmo modo que não se pode aceitar com naturalidade que um parlamentar com as opiniões de Feliciano conduza um órgão destinado a proteger, entre outras, as vítimas da discriminação e do preconceito, é inconcebível que se considere natural que entidades confessionais possam ser incluídas entre aquelas apropriadamente credenciadas para questionar no STF a adequação das leis à Constituição. Delas, convém lembrar, fazem parte as legendas com assento no Congresso - como o PSC de Feliciano. Felizmente, o projeto de emenda constitucional aprovado na CCJ tem ainda um longo percurso pela frente. Será submetido à Comissão Especial da Câmara e, eventualmente, ao plenário da Casa, em duas votações com quórum qualificado. Passando, enfrentará o mesmo rito no Senado. Tempo bastante e instâncias suficientes de decisão para que tenha o merecido destino - o arquivamento.