segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Friedrich Gulda

           Tenho profunda admiração por este cara, um pianista de respeito que transitou entre o clássico e o jazz. Eis um documentário sobre sua vida


Crônica dos anos soviéticos sob o domínio de Stálin

"Olhando para o retrato de Stálin pendurado na parede, Guétmanov levantou o cálice e disse:
- Então camaradas, o primeiro brinde é para o nosso pai. Saúde a ele!
Disse essas palavras com uma voz um tanto rústica e amistosa. A conotação desse tom sem floreios era que todos conheciam a grandeza de Stálin, mas as pessoas reunidas à mesa bebiam à sua saúde apreciando nele acima de tudo o ser humano simples, modesto e sensível. E o Stálin do retrato, com os olhos semicerrados, parecia olhar para a mesa e para os seios fartos de Galina Teriêntievna e dizer: 'Rapaziada, vou pitar o meu cachimbo e me sentar mais perto de vocês´.
- Verdade, vida longa ao nosso pai - disse o irmão da dona da casa, Nikolai Tiriêntievitch. - O que seria de nós sem ele?
Ele olhou para Sagaidak, segurando o cálice perto da boca, esperando que ele dissesse algo, mas Sagaidak contemplou o retrato: 'DE QUE É QUE SE PODE FALAR, NOSSO PAI? VOCÊ JÁ SABE TUDO´, e bebeu. Todos beberam" Vassili Grossman, Vida e destino, pp.110-111.

Obs.: não podia deixar passar essa sem pública-la, o final em caixa alta é por minha conta.
             Quando aparece alguém aqui em casa, é normal entabular uma conversa com a frase, "pra que esse tanto de livros, você já leu todos?". Acostumado, respondo, "eles estão aí, quando preciso leio uma página". É sempre assim, perguntam sobre a finalidade, desgraçada pequenez de espírito. Então, na quinta-feira a agente de saúde visita a minha residência, ao adentrar a sala, encontra uma estante abarrotada de livros, passa à copa e encontra mais duas, e para diante delas. Enquanto isso procuro o tal do papelzinho de controle. Ela pergunta, "você gosta de história", falo para ela que sim. Ela fica admirando os livros, e continua, "minha filha cursa História, eu curso Pedagogia, ela adora livros, eu também". Pensei, "coisa maravilhosa, alguém vir aqui e não perguntar sobre a função dos livros, e se já li todos". Entusiasmado com o inusitado, levei-a até o escritório onde estão mais algumas estantes abarrotadas de livros. Ela olhou os livros, mas tinha que voltar a rotina de trabalho. Eu no fundo, bem no fundo, fico pensando, "pra que" tantos livros, eles estão aí por mera compulsão, não rendem títulos, reconhecimento, ou qualquer coisa além do prazer da leitura. Mas isso já é alguma coisa!